Um Ministério ridículo

Ainda é complicado para mim comentar sobre o segundo mandato de Dilma sem hard feelings acumulados contra amigos e conhecidos que tiveram um comportamento execrável durante as eleições, compartilhando todo tipo de jogo baixo e usando a simbólica do que um dia o PT representou como o álibi geral inclusive para ridicularizar seus oponentes. Infelizmente, a questão aqui não é estar ou ter estado certo: a questão é que objetivamente é possível verificar a total dissonância cognitiva entre as expectativas e demandas do governismo e a realidade nua e crua do governo. Alguns disseram que simplesmente não entendi nada da conjuntura, do que está em jogo, do progresso que poderia ser interrompido pela malvada Marina Silva. Não podemos esquecer o linchamento a que foram submetidos Luiz Eduardo Soares, Marcos Rolim e outros apoiadores que permaneceram firmes com Marina no primeiro turno, respondendo a trolls que agiam como se estivéssemos na vanguarda da esquerda mundial.

O que dizer desse ministério patético anunciado por Dilma? Alguns nomes nem precisam comentário: colocar Kátia Abreu na agricultura, por exemplo, é o maior sinal de que aquilo que viam os críticos ao governo, o perfil ruralista de Dilma no campo, não era paranoia nem exagero: agora se oficializou em cargo. Já sabemos que continuaremos a pleno vapor a destruição do ecossistema brasileiro, inclusive porque o emérito Aldo Rebelo, que não é apenas um completo e total ignorante em matéria ambiental, mas antes um negacionista (das mudanças climáticas) da pior espécie, assumirá a pasta de Ciência e Tecnologia. Em síntese, Dilma montou uma “equipe” para sustentar todo seu desvairio desenvolvimentista passando a patrola sobre o meio ambiente (e com ele vamos todos nós, mas especialmente índios, ribeirinhos etc.).

Precisa comentar o demonizado Gilberto Kassab pelo próprio PT, ex-prefeito de São Paulo de perfil conservador e vinculado a partido fisiológico? A entrega do Ministério do Esporte para os fundamentalistas evangélicos? Precisa comentar que o político acusado do maior número de casos de corrupção do Rio Grande do Sul, Eliseu Padilha, está voltando ao Ministério? E a cota de Jader Barbalho no ridículo Ministério da Pesca? Não, sem comentários. Como disse o Leonardo Sakamoto, se der mais tempo, Dilma talvez indicasse o Tiririca, não fosse o fato de que o cidadão tem muito mais credibilidade que vários dos ministros indicados.

E pensar que tive que aguentar, depois de quatro anos de militância virtual mostrando os “retrocessos” da Dilma em relação ao Governo Lula, gente que milita de quatro em quatro anos apontando para Joseph Stiglitz ou Boaventura de Souza Santos como suposto modelo do que estaria sendo enfrentado pela “direita” ou pela “nova direita” neoliberal. O que dirá Boaventura, ele próprio totalmente equivocado durante a campanha, da indicação de Levy para o Ministério da Fazenda? Dilma seguindo exatamente o script que Marina e Aécio diziam que qualquer um teria que seguir. Mas sempre haverá diversionismo. No fim, as boas intenções escondidas do PT, essa fonte infinita de recursos que nunca se esgota nas práticas, diferenciam o atual Governo da malvada e golpista oposição. Um governo insuscetível de críticas — a não ser a corrupção (que em todo caso é sistêmica e não tem nada a ver com decisões políticas) — como li por aí. É vergonhoso o estado de indigência intelectual dos apoiadores do governo.

Fico com a última crítica: como venho dizendo há anos, o PT não tem política de educação. Perguntei durante meses para todos os meus amigos se sabiam quem era o Ministro da Educação pós-Mercadante e ninguém sabia responder. É verdade que o PT investiu nas Universidades Públicas muito mais que o PSDB (fui aluno de Federal de 1998 a 2004, passando por 3 ou 4 greves) e no ensino técnico, mas sempre sem programa e sem qualificação substancial. O que mudou na política produtivista e quantitativa com a qual o ensino superior é avaliado, por exemplo? Nada. Perspectiva de mudança? Nenhuma. O que mudou no ensino médio e fundamental em termos de investimentos que poderiam, como Safatle vem destacando há bastante tempo, qualificar uma mudança radical na sociedade brasileira, podendo a classe média (especialmente a classe média baixa, ou classe C) liberar-se de pagar colégios caríssimos para seus filhos? Na verdade, a educação hoje está pautada pelas duas obsessões de Dilma: o ensino técnico, de preferência sem filosofia e sociologia (pura perda de tempo, coisa de petista) e o Ciência sem Fronteiras, programa com alguma valia, mas que é executado no momento em que o Brasil já tem centros de excelência e é muito menos importante que o investimento nos bolsistas de mestrado e doutorado, por exemplo, que recebem menos de R$ 2.500,00. Lembre-se que para chegar a um doutorado não apenas o sujeito tem que estudar e se qualificar muito a vida inteira, como isso também leva tempo, o que significa que chega por volta dos 30-35 anos, no mínimo, nessa etapa. Estaria um profissional qualificado ganhando tão pouco no mercado na mesma etapa? O Brasil tem alternativas para esses pesquisadores? Não. Mas agora, com Cid Gomes, um entendido em educação, tudo vai mudar. Realmente, educação está longe de ser prioridade no atual governo.

Em síntese, como previsto por muitos, o Governo Dilma será ainda pior que o primeiro. Quatro longos anos em que veremos o PT sangrar gastando suas últimas reservas de credibilidade à esquerda para, no próximo pleito, lançar sua última cartada com o retorno de Lula. Será uma legítima agonia para todos nós.